O círculo no meio da página, dividido.
Não pude deixar de notar essa estética apresentada entre as páginas desse livro. Uma simetria, um contraste que me rendeu alguns minutos de atenção, e de leitura também.
Há um momento em que Calligaris fala da experiência estética pensando enquanto um juízo aplicado à vida. Não é sobre o belo, sobre formas, cores, sobre a experiência de estar diante uma obra de arte. Gosto bastante da sua ideia que extrapola os limites da moldura, para pensar esse carácter estético como uma atitude diante da vida.
Tem algo de belo dessas experiências mundanas da vida que nos marcam. Detalhes, fragmentos, memórias. Calligaris faz isso nos contando um pouco de seus momentos com o pai. Na sua biblioteca, com suas diversas prateleiras, recheadas de livros, estavam também presentes os buracos. Poderíamos achar que era uma dica de decoração, de estilo, de estética. Mas tinha uma atitude aí. O pai diz:
“Por mais que hajam livros, por mais que a gente leia ou escreva, sempre haverá buracos nas estantes, e, aliás, é importante que a biblioteca tenha buracos nas estantes”
Há livros que são escritos para tampar os buracos da estante, e há livros que são escritos para preservar os buracos na estante
Foi assim, talvez, que eu tenha sido capturado pelo círculo, ou melhor pelo buraco. Dividido entra a parte preenchida e a parte preservada do vazio. Por aí, circulamos.
Me emocionei ao ler essa circularidade presente no próprio livro. Do prefácio, que é escrito pelo filho do Calligaris, e, mais ainda com o epílogo, em que o autor nos conta dos momentos finais do próprio pai. Um SPOILER, mas nem tanto assim, já que morrer faz parte do viver. E não digo isso enquanto seu sentido. Como nos ditos populares em que se diz que o sentido da vida é a morte.
Calligaris nos deixa - além da saudade - circulando, preservando certos buracos e fazendo disso uma experiência de vida.
Otimo
Muito bom!